Segundo Antônio, ele nunca passou por nenhuma situação parecida com essa. "Foi uma invasão na minha propriedade. Tem uma nascente que abastece a comunidade, então se não fossem barrados chegariam ao topo da serra", relata.

Antônio conta que, em nenhum momento, foi procurado pela multinacional francesa.
"Eu fiquei abalado, porque invadiram o terreno. Eu não tinha contrato com eles [Voltalia] e, mesmo que tivesse, eles não podiam entrar sem avisar. Eu tenho contrato com outra empresa, focada em energia eólica, que é bem organizada e respeita o meio ambiente", diz.
A propriedade rural era o meio de sustendo da família de Antônio, mas devido a problemas de saúde e por causa da seca na região, a família não planta mais no local.

"Já plantamos feijão, algodão e mamona. Em cima da serra, [plantamos] mandioca. Devido aos problemas de saúde e à seca que enfrentamos não podemos plantar mais. Era lá que tirávamos o sustento da família", diz.

Ele registrou um boletim de ocorrência na delegacia para denunciar o fato e comprovar que não autorizou a suposta invasão.

Por meio de nota, a Polícia Civil informa que as investigações já foram iniciadas e os depoimentos estão agendados ainda para agosto, mas as datas não foram reveladas.

Ainda em nota, a polícia diz que a unidade onde o caso foi registrado também deve solicitar perícia e que não poderia passar mais detalhes para não interferir no andamento das apurações.

 

Outras denúncias

O segundo lavrador, que será chamado de Miguel nesta reportagem, informou que a Voltalia queria fazer contrato com ele, mas ele já havia feito com outra empresa.

"Outro vizinho [Antônio] que tem o terreno fez a denúncia. Não atingiu a minha propriedade, passou perto, mas se eles [Voltalia] fizessem a curva ia pegar na minha propriedade. Só não fizeram [a curva] porque o pessoal do meio ambiente parou eles", diz.

Já o terceiro lavrador, João, conta como a multinacional francesa chegou no local.

"Essa Voltalia chegou tem entre 60 e 70 dias. Eles invadiram as terras com maquinário e subiram a serra", conta.

Ele conta que os moradores da região tinham acesso ao local que foi desmatado por meio de uma trilha de pedestres.

"Eles [Voltalia] derrubaram umbuzeiro, que não pode derrubar. O Ministério do Meio Ambiente recomenda o que pode e o que não pode, e eles derrubaram", diz.

A derrubada do umbuzeiro, que é um tipo de árvore, é proibida em todo o país desde 2005. A medida foi aprovada pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

De acordo com o terceiro lavrador, se a abertura de caminho continuasse, poderia atingir uma nascente que tem na região.

"Por isso pedimos para parar, porque ia atingir a nascente que fornece água para 90 famílias. Se atingisse a nascente, essas pessoas ficariam sem água", explica.

Denúncia ao Incra-BA

Além do boletim de ocorrência registrado por Antônio, houve também uma denúncia encaminhada ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária da Bahia (Incra-BA) feita por um agricultor. Um engenheiro agrimensor, que também não quis se identificar, participou da denúncia como responsável técnico.

"Ela [Voltalia] está arrendando uma área que foi invadida por grilagem, que estavam tentando grilar. Então ela [Voltalia] está conivente com a grilagem", conta o engenheiro.

Segundo o homem que participou da denúncia como responsável técnico, houve abertura de acessos para que fosse possível chegar a uma área mais alta da propriedade para instalação de possíveis torres de medição.

O engenheiro ainda detalha que soube do fato pelo boletim de ocorrência registrado por Antônio, que diz que a propriedade foi invadida. Segundo ele, até a publicação desta reportagem, houve desmatamento em duas áreas, mas ele não detalhou os locais.

De acordo com o engenheiro, duas pessoas que supostamente estariam tentando se apossar das terras por meio de grilagem não conseguiram provar o domínio.

Por meio de nota, o Incra-BA diz que com base nos dados que envolvem certificação e sobreposição de uma propriedade rural, a Superintendência Regional do Incra na Bahia verificou duas certificações relacionadas ao imóvel rural, sendo que uma delas já foi cancelada e a outra encontra-se com requerimento de cancelamento em análise.

Ainda na nota, o Incra-BA esclarece que a certificação é um instrumento declaratório apresentado pelo técnico e o proprietário rural. Desse modo, não comprova o domínio sobre a terra, que é atribuição de documentos cartoriais.

O engenheiro agrimensor reforça que esse caso se caracteriza como invasão, uma vez que os dois posseiros que deram entrada no Incra-BA com essas áreas afirmam ter contrato com a empresa Voltalia.

"O que indica que estão querendo tomar posse de uma área que é de interesse da empresa para instalação de torres e a empresa está intermediando um acordo para resolução deste conflito", explica.

Segundo o engenheiro, eles decidiram fazer a denúncia por se tratar de empresa francesa instalada no Brasil, no entanto, equiparada à estrangeira pelo fato do capital social ser composto de estrangeiros. "Ela necessita de autorização do Incra para aquisição ou arrendamento de imóvel rural no país e, dependendo a área, até do Congresso Nacional", comenta.

"O presidente da França Emmanuel Macron vive criticando desmatamentos no Brasil, mas aí vem uma empresa francesa e faz isso aqui", conclui.

O que diz a Secretaria de Meio Ambiente de Dom Basílio

Por meio de nota, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMMARH) de Dom Basílio diz que foi informada de uma manutenção de trilha na respectiva área e que encaminhou uma equipe técnica para averiguar os fatos.

Na inspeção local, a prefeitura não encontrou irregularidades, mas depois, notou ausência de comunicação para manutenção da estrada. Confira o que diz a nota da secretaria na íntegra:

"A Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Dom Basílio - BA, foi informada de uma manutenção de trilha na respectiva área, imediatamente encaminhou uma equipe técnica para averiguar os fatos. In loco, a equipe ao realizar a vistoria técnica não identificou qualquer indicio de infração que pudesse caracterizar desmatamento, grilagem, nem tão pouco invasão de propriedade, visto que a atividade que estava sendo realizada, tratava-se da manutenção de uma trilha, conhecida por "estrada vicinal", de responsabilidade pública, com isso, essa Secretaria afirma que não houve violações legais. No entanto, ao averiguar a ausência de comunicação para manutenção da estrada, a aludida empresa foi convidada a suspender as atividades até a respectiva formalização. Imediatamente o pedido fora atendido estando suspensas quaisquer atividades no local. No tocante ao aspecto indenizatório ao proprietário, como já abordado acima é um acesso público "estrada vicinal", não existindo cunho indenizatório, com base na legislação vigente desse município".

Confira íntegra do posicionamento da Voltalia

A Voltalia Energia do Brasil repudia veementemente qualquer irregularidade ou ação em contrariedade à legislação brasileira e esclarece que não procede qualquer denúncia de grilagem ou invasão de propriedades atribuída a ela e, mais especificamente neste caso, no município de Dom Basílio, no Sudoeste da Bahia. A empresa afirma que cumpre rigorosamente a legislação ambiental e imobiliária e, no que se refere ao contexto da regularização fundiária nas áreas consideradas de posse, visa sempre a homologação dos órgãos públicos e regulamentadores em seus respectivos processos.

A Voltalia Energia do Brasil repudia veementemente qualquer irregularidade ou ação em contrariedade à legislação brasileira e esclarece que não procede qualquer denúncia de grilagem ou invasão de propriedades atribuída a ela e, mais especificamente neste caso, no município de Dom Basílio, no Sudoeste da Bahia. A empresa afirma que cumpre rigorosamente a legislação ambiental e imobiliária e, no que se refere ao contexto da regularização fundiária nas áreas consideradas de posse, visa sempre a homologação dos órgãos públicos e regulamentadores em seus respectivos processos.

 

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